“Tarifas de 50% aplicadas pelos EUA ao Brasil levantam dúvidas sobre os efeitos indiretos no PIB e no ritmo da construção civil em 2025 e 2026.”
O setor da construção civil sempre foi considerado um termômetro da economia brasileira. Quando o Produto Interno Bruto (PIB) cresce, as obras aceleram; quando há retração, os canteiros rapidamente sentem os efeitos. Nesse contexto, o recente anúncio do governo norte-americano de impor tarifas de 50% sobre produtos brasileiros trouxe apreensão para empresários e analistas do setor.
Embora a construção civil não dependa diretamente das exportações para os Estados Unidos, a medida pode provocar um efeito cascata na economia, reduzindo o crescimento do PIB, pressionando custos de insumos e tornando o crédito ainda mais caro.
A interdependência entre PIB e construção
A construção civil é altamente sensível ao desempenho da economia. Segundo dados da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic), mais de 90% da atividade do setor está relacionada ao mercado interno — habitação, obras de infraestrutura e empreendimentos comerciais. Isso significa que, mesmo sem exportar diretamente, qualquer turbulência econômica se reflete em investimentos, geração de empregos e novos lançamentos.
Nos últimos anos, o setor vinha numa trajetória de recuperação. Em 2024, a construção cresceu 3,4%, impulsionada por programas habitacionais, crédito subsidiado e demanda reprimida do período da pandemia. Para 2025, as projeções indicam 2,3% de expansão, mas os efeitos do “tarifaço” norte-americano já começam a colocar essa estimativa em xeque.
Por que as tarifas importam para a construção?
Mesmo que as construtoras brasileiras não exportem diretamente para os EUA, os impactos indiretos são relevantes:
- Menor crescimento econômico:
Estudos apontam que as tarifas podem reduzir o PIB brasileiro em até 0,4% em 2025. Pode parecer pouco, mas, em um cenário de juros elevados, qualquer desaceleração pesa no ritmo de obras e na geração de empregos.
- Custos de insumos
Materiais como aço e alumínio são utilizados em larga escala pela construção civil. Com as tarifas, há risco de repasse de preços e encarecimento desses insumos, pressionando o orçamento das obras.
- Incerteza para investidores
O ambiente de instabilidade dificulta novos lançamentos, já que construtoras e incorporadoras tendem a adotar uma postura mais conservadora diante do risco de retração da economia.
- Crédito mais caro
O crédito imobiliário, essencial para financiar a compra de imóveis, já vem sofrendo com a Selic a 15% ao ano. Em paralelo, o financiamento habitacional via SBPE registrou queda de 62,9% no volume contratado em 2025 até maio, comparado ao mesmo período de 2024.
Em maio de 2025, a construção civil registrou o maior número de trabalhadores formais em mais de 10 anos, segundo levantamento da Cbic com base no Caged. Esse resultado reforça a importância social do setor, que emprega milhões de brasileiros em diferentes níveis de qualificação. Contudo, como destacou Renato Correia, presidente da Cbic, o emprego está diretamente atrelado ao desempenho do PIB. Se a economia desacelerar por causa dos reflexos das tarifas, essa conquista pode ser rapidamente revertida.
O papel dos juros e do crédito
Mais do que as tarifas em si, o maior desafio para a construção civil em 2025 continua sendo o custo do crédito. A Selic em 15% encarece financiamentos, inibe investidores e dificulta o acesso da população a imóveis. Economistas do setor alertam que, se o ambiente de juros elevados persistir até 2026, o risco de desaceleração mais acentuada é significativo. Ou seja, mesmo que o PIB siga crescendo, o setor pode sentir uma queda forte nos lançamentos e na demanda habitacional.
O que pode amortecer os impactos?
Apesar do cenário de incerteza, há fatores que podem ajudar a construção civil a enfrentar os efeitos indiretos do tarifaço:
- Obras já lançadas – O estoque de projetos iniciados em 2023 e 2024 ainda sustenta atividade e geração de empregos em 2025.
- Programas habitacionais – Iniciativas como o Minha Casa, Minha Vida continuam sendo pilares de demanda para o setor.
- Inovação e industrialização – Empresas que investem em tecnologias construtivas, como a parede de concreto com formas de alumínio, tendem a manter margens mais equilibradas, já que reduzem desperdícios e aumentam produtividade.
- Parcerias público-privadas – Projetos de infraestrutura e concessões também podem criar demanda estável em um período de turbulência econômica.
A projeção da Cbic de 2,3% de crescimento em 2025 carrega um “otimismo moderado”, segundo a economista-chefe Ieda Vasconcelos. Isso porque o ritmo atual ainda reflete lançamentos anteriores, mas as expectativas para novos empreendimentos estão em queda.
Se o cenário internacional se estabilizar e houver redução gradual da Selic, a construção civil pode manter o crescimento. Caso contrário, o setor pode enfrentar uma desaceleração mais dura em 2026, com queda na geração de empregos e menor dinamismo econômico.
O “tarifaço” imposto pelos Estados Unidos ao Brasil é um exemplo claro de como a construção civil é impactada por fatores que vão além do canteiro de obras. Não se trata apenas de exportações ou importações, mas de toda a rede de interdependência econômica.
Para enfrentar esse cenário, será fundamental acompanhar de perto os desdobramentos da política comercial internacional, ao mesmo tempo em que o setor busca eficiência, inovação e produtividade para atravessar possíveis turbulências.
Assim como aconteceu em outros períodos de crise, a construção civil pode novamente ser uma das forças motrizes da recuperação econômica, desde que consiga equilibrar custos, crédito e confiança em meio à instabilidade global.
Fontes
- CNN Brasil – Impactos do tarifaço ao PIB preocupam setor de construção civil (Reuters, 28/07/2025)👉 https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/impactos-do-tarifaco-ao-pib-preocupam-setor-de-construcao-civil/
- UOL Economia – Construção civil vê com preocupação potencial impacto de tarifas dos EUA no PIB, diz Cbic (2025)👉 https://economia.uol.com.br/noticias/reuters/2025/07/28/construcao-civil-ve-com-preocupacao-potencial-impacto-de-tarifas-dos-eua-no-pib-diz-cbic.htm
- VEJA – Com exceções, impacto de tarifas de Trump no Brasil é de até 0,4% do PIB (2025)👉 https://veja.abril.com.br/economia/com-excecoes-impacto-de-tarifas-de-trump-sobre-pib-brasileiro-cai/
- Cimento Itambé – Quais os impactos do tarifaço de Trump para a construção civil brasileira?👉 https://www.cimentoitambe.com.br/quais-os-impactos-do-tarifaco-de-trump-para-a-construcao-civil-brasileira/
- IstoÉ Dinheiro – Construção civil vê com preocupação potencial impacto de tarifas dos EUA no PIB, diz Cbic👉 https://istoedinheiro.com.br/construcao-civil-preocupacao-impacto-tarifas-pib-cbic